Destinado a “suprir” a falta de docentes, foi criado pela Pró-Reitoria de Graduação da Unesp o Programa de Mobilidade Docente na Graduação, já para o ano letivo de 2019. O objetivo, segundo o edital do programa, é “incentivar a mobilidade dos/as docentes interessados/as em ministrar disciplinas obrigatórias, em suas especialidades, também em outros cursos de graduação da Unesp e fora de sua cidade de atuação”. Para esse fim, é definido um “auxílio financeiro” de R$ 5 mil para cada bloco de 60 horas/aula, com limite de 120 horas/aula por semestre.
Nos debates realizados nas últimas duas plenárias da Adunesp (em Marília, 17/10, e em Rio Preto, 7/11), a iniciativa foi vista com muita preocupação. Se há falta de docentes na Unesp, como tirar alguém do seu campus para ministrar aulas em outro campus? Isto certamente terá impacto nas atividades de pesquisa, extensão, orientação e gestão no campus de origem. E como esse campus poderá solicitar contratações futuras, se possui docentes saindo para dar aulas em outras unidades? Certamente, há um apelo econômico importante no programa, uma vez que nossos salários estão sob forte arrocho e, diante disso, há colegas vendo uma chance de aumento em seus proventos. Mas se trata de uma "saída" que trará algum benefício financeiro para poucos, além do risco de prejuízo significativo para os nossos programas de graduação e pós-graduação, e uma evidente precarização das condições de trabalho docente.
A pedido da Adunesp, a assessoria jurídica da entidade fez um parecer sobre o programa, que você confere a seguir:
“Trata-se de um programa de adesão voluntária, o que implicaria, no caso dos docentes celetistas, numa alteração bilateral de vontades do respectivo contrato de trabalho, o que é factível no nosso ordenamento jurídico. Já em relação aos estatutários, não implicaria numa mudança de lotação originária do cargo, porém, nesse caso, a instituição desse programa por meio de uma previsão normativa interna, gera direitos e deveres, não previstos no Estatuto da UNESP e, tampouco no Estatuto dos Funcionários Públicos de São Paulo, ou seja, dada a ausência de previsão estatutária, poderia ser passível de questionamento legal.
Destacamos, ademais, como irregularidade no programa de mobilidade proposto pela UNESP, a inexistência de critério para escolha dos docentes a serem aprovados no programa (item 10.1). Diz o programa haver uma limitação orçamentária, mas quais os critérios a serem adotados para aferição dos pedidos, não está preceituado. Decorre dessa obscuridade a possibilidade de rejeição dos pedidos de uns, e acolhimento dos pedidos de outros, sem motivação aparente, apresentando malferimento ao princípio da isonomia e igualdade de tratamento. Não podem as decisões administrativas ficarem ao livre arbítrio da Administração Pública que, deve, em razão do princípio da transparência e da isonomia, desde o início do programa, estabelecer os critérios de decisão, seja pela ordem de apresentação, pelo estabelecimento de prioridades acadêmicas, em razão do déficit de docentes de determinados departamentos, por antiguidade, enfim, devem ser definidos, claros e objetivos os critérios. A subjetividade para casos tais é incompatível com as regras de direito público.
Apontamos ainda a ausência de celebração pela Universidade de um contrato de seguro, muito embora, em não havendo seguro, qualquer acidente ocorrido no percurso caso/trabalho/casa deverá ser considerado como acidente de trabalho, sendo a culpa do empregador objetiva, que independe de prova.
Por outro lado, se a Administração Pública aponta, ou reconhece, os locais de maior déficit de professores para colocação de vagas no programa de mobilidade docente, parece um transtorno à UNESP não justificar a abertura de cargos nessas posições quando os mesmos forem criados, devendo aparecer como prioridade na abertura de concursos públicos, não podendo serem abertos cargos em outros locais em detrimentos destes em que, reconhecidamente, a Universidade aponta como deficitários.
Considerando, outrossim, outros elementos, temos ainda a ponderar que o programa foi criado tendo os seguintes elementos presentes:
i) reconhecido déficit de servidores docentes em determinadas áreas pela Administração;
ii) pagamento extra com despesa de pessoal, proveniente de verba orçamentária, para pagamento do programa de mobilidade;
iii) preterição da contratação de professores substitutos, tendo em vista a necessidade permanente e não temporária do serviço;
iv) existência de cargos públicos disponíveis e estocados pela UNESP.
Assim sendo, em razão dos elementos acima presentes, além da inexistência da previsão estatutária, o programa se revela uma burla à necessidade de contratação por meio de concurso público, o que enseja a viabilidade de um debate judicial acerca da inconstitucionalidade da instituição do programa nos moldes existentes.
São Paulo, 03 de dezembro de 2018.
Assessoria Jurídica da ADUNESP”